Descrição do Projeto


Introdução

O Observatório Nacional, criado em 1827, é uma das instituições científicas mais antigas do país, sendo responsável por uma série de trabalhos importantes na história do seu desenvolvimento técnico-científico. Destacam-se o pioneirismo nas pesquisas de ponta em Astronomia, Geofísica e na determinação e disseminação da hora legal brasileira, relevante serviço prestado ao país.


Importância

Apesar de restrito no âmbito das atividades propostas à preservação e difusão de uma parte do acervo da biblioteca do Observatório Nacional, este projeto pretende ampliar o raio de interação com outros centros de pesquisas que hoje se dedicam à manutenção da memória científica nacional. Para tal, os resultados do projeto estão disponibilizados na página web (www.on.br/placas) e no acervo físico da instituição. Com isso, espera-se aumentar a sua visibilidade para a sociedade.

Internamente, o projeto vem fortalecer o plano de conservação e restauração do acervo, passando a motivar e envolver mais pesquisadores interessados na preservação da memória científica do Observatório Nacional.


Objetivo

O projeto tem como objetivo a preservação da memória científica do Observatório Nacional expressa no acervo histórico de 948 placas fotográficas em vidro.

Em 2015, num trabalho preliminar experimental, foram selecionadas 61 placas fotográficas, onde se incluíam as observações do eclipse e de imagens do cotidiano da cidade de Sobral, localizada no Estado do Ceará, Brasil. Este eclipse teve particular importância para a Física moderna, pois, a partir de sua observação, foi possível comprovar um dos postulados da Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein (1879-1955): o efeito da deflexão da luz, no qual um feixe de luz (neste caso, vindo de uma estrela) deveria ter sua trajetória encurvada (ou desviada) ao passar nas proximidades de um forte campo gravitacional (no caso, gerado pelo Sol).

Esse subconjunto de placas foi higienizado, digitalizado em alta resolução e acondicionado, preservando as informações contidas nele. Os resultados deste trabalho foram publicados na Revista Ciência Hoje, novembro 2015, 331, Vol. 56, págs.34-39, Revista da Fapesp, Ed. 240, fevereiro 2016 e no sítio: https://daed.on.br/sobral/

Diante dos bons resultados, a partir deste trabalho houve uma motivação maior para dar continuidade na digitalização de todo o acervo de placas fotográficas. Em janeiro de 2018 foi iniciado o projeto Memória fotográfica em placas de vidro, estabelecendo o seguinte cronograma de trabalho:

  1. Classificação das placas em 13 grandes assuntos
  2. Desenvolvimento de softwares para gerenciar o banco de imagens
  3. Confecção das embalagens em papel especial
  4. Higienização das 948 placas fotográficas do acervo
  5. Digitalização das placas, gerando imagens de alta resolução para compor o banco de dados
  6. Acondicionamento das placas em embalagens especiais
  7. Inclusão das placas no acervo físico da biblioteca
  8. Criação de mecanismos para disponibilização das imagens na página institucional

O projeto partiu do princípio que as imagens registradas em placas de vidro, além do seu valor como patrimônio cultural, se constituam em fontes importantes para historiografia da ciência.

Dessa forma, são metas deste projeto:

  1. Aumentar a visibilidade do acervo da biblioteca do Observatório Nacional
  2. Disponibilizar o trabalho para a sociedade, oferecendo um material:
    classificado, higienizado e digitalizado, preservando assim as informações,
    expressas na sua essência, por imagens registradas nas placas fotográficas.

Justificativa

Este não é um projeto de pesquisa científica, pois muitas das imagens registradas sobre as placas fotográficas carecem de informações completas e precisas, tais como, datas, autores, locais, descrição dos objetos e bibliografia. Essas placas foram obtidas entre o final do século XIX e meados do século XX.

Em geral, a história antiga é imprecisa por natureza. É nesse pressuposto que se toma como base dizer que o Observatório Nacional tem um acervo de placas de vidro que mostram momentos da história da Astronomia, Geofísica e cotidiano, mas, por falta de algumas informações, não podem ser utilizadas para fins científicos. As informações foram buscadas exaustivamente em inúmeras fontes bibliográficas, em relatos, interpretações e suposições pessoais.

Pode-se dizer que este é um trabalho em aberto por falta de algumas informações. Por isso a contribuição e colaboração de especialistas ou conhecedores do assunto é muito importante. No entanto, não se pode deixar de reconhecer a sua relevância histórica, pois o simples fato de se ter um expressivo número de imagens sobre placas de vidro, evidencia uma rica fase do registro fotográfico do Observatório Nacional.

Apesar das incertezas, essas imagens não deixam de ser fortes e emocionantes, pois trazem na sua essência a energia do esforço de guardar um período temporal único. São imagens obtidas sem muitos recursos técnicos, sem tratamentos computacionais sofisticados, mas que revelam a sua autenticidade e naturalidade.

Notadamente, a riqueza de cada imagem está no cuidado com a escolha da emulsão fotográfica, da quantidade de luz incidente sobre a objetiva das câmeras e no detalhe do ângulo, captados pelo olhar sensível de um astrônomo ou de um fotógrafo. A moderna tecnologia “RGB (Red Green Blue) ”, para compor imagens com milhões de cores, que chegou ao mercado comercial em 1907, não diminuiu o interesse pela fotografia em preto e branco, com uma extensa escala em tons de cinza. Até os dias de hoje, início do século XXI, fotógrafos profissionais fazem registros na escala monocromática.

Por fim, não é objetivo deste projeto fazer qualquer comentário ou análise científica sobre o material apresentado.


Infraestrutura

Todas as atividades do projeto, como higienização, acondicionamento, digitalização e disseminação, foram desenvolvidas e realizadas nas dependências da biblioteca do Observatório Nacional.


Recursos humanos

O projeto foi desenvolvido por uma equipe composta de um pesquisador da Coordenação de Astronomia e Astrofísica (COPAA), duas bibliotecárias do Núcleo de Informação e Documentação (Nucid), um bolsista do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) e um colaborador para desenvolver aplicativos Web, dedicados à contextualização histórica da produção do conhecimento científico na instituição. Trata-se de uma equipe multidisciplinar, reunida em torno do interesse na preservação da memória científica do Observatório Nacional.


Classificação das placas fotográficas

O conjunto de 948 placas em vidro foi digitalizado com o objetivo de preservar a memória fotográfica do Observatório Nacional, cujas imagens têm relevância no cenário histórico-científico do Brasil.

Mais de cem anos de observações e registros fotográficos em placas de vidro realizadas no campus do Observatório Nacional e nas expedições e campanhas nacionais e internacionais foram classificadas, higienizadas, digitalizadas e armazenadas, cujas imagens, principal resultado deste longo trabalho, estão disponibilizadas para toda a população.

Este importante acervo contém imagens de eclipses totais e parciais do Sol e da Lua, planetas, campos e aglomerados estelares, cometas, asteroides, instrumentos científicos, cúpulas, edificações, sismogramas e magnetogramas e o cotidiano das expedições científicas, registrado por Henrique Morize (1860-1930), importante diretor para a história do Observatório Nacional.

As placas fotográficas foram classificadas em treze grandes assuntos. Para fins de organização e referência, cada assunto possui uma sigla, diponibilizada entre parênteses. Assim, as imagens digitalizadas têm o nome formado, inicialmente, por três letras associadas a um número para facilitar a sua localização no banco de dados digital e no acervo físico da biblioteca do Observatório Nacional.

As imagens e suas informações podem ser acessadas na página principal deste site, clicando-se em uma das treze ícones do mosaico ou em um dos itens no Menu da barra lateral.


Tratamento e higienização do material

O tratamento e higienização das placas fotográficas obedeceu às normas estabelecidas pela Fundação Nacional de Artes (Funarte). Trata-se de uma fundação do governo federal brasileiro, ligada ao Ministério da Cultura, que, dentre os seus objetivos de políticas públicas, incentiva a preservação da memória nacional.

Realização do delicado processo de higienização e digitalização das placas fotográficas, que são acondicionadas em papel próprio para a embalagem desse tipo de material, evitando uma possível reação química com a emulsão fotográfica. Crédito: Observatório Nacional.

Foi realizada uma delicada higienização somente no vidro, lado contrário ao da emulsão fotográfica, que é uma combinação de gelatina com sais de prata sensíveis à luz, onde estão registradas as imagens. As placas têm dimensões que variam de 9cm x 12cm a 30cm x 24cm.

As placas, que têm dimensões que variam de 9cm x 12cm a 30cm x 24cm, foram acondicionadas em papel próprio para a embalagem desse tipo de material, evitando uma possível reação química com a emulsão fotográfica.

Muitas placas foram encontradas em péssimo estado de conservação: pintadas com tinta vermelha (com o propósito de destacar detalhes das imagens), emulsão soltas, quebradas, entre outras depredações.

As placas em vidro são armazenadas em envelopes, onde constam as seguintes informações adesivadas: número sequencial por assunto, uma ficha descritiva do conteúdo da placa e a sua imagem em papel.

Crédito: Observatório Nacional

Acima, pode-se ver, como exemplo, um envelope, que abriga uma placa fotográfica, onde é mostrado o número sequencial, uma ficha descritiva, dentro do assunto abordado e uma cópia em papel da imagem da placa.


Desenvolvimento de softwares

Para organizar, gerenciar e viabilizar as informações geradas a partir da digitalização do acervo de placas fotográficas em vidro do Observatório Nacional, foi necessário desenvolver programas de computador (softwares) que gerassem dados prévios e construísse um banco de dados digital para otimizar o trabalho. Assim sendo, os programas produziram listas ordenadas por assunto, a numeração contínua das imagens e as etiquetas para serem adesivadas nos envelopes que armazenam as placas.

Esses programas foram concebidos como sistema de informação para otimizar as várias fases do processo de produção deste trabalho.


Processo de digitalização e armazenamento

As placas fotográficas foram digitalizadas com equipamento próprio para imageamento de diapositivos. O equipamento foi configurado com parâmetros adequados para gerar imagens de alta resolução com 1200 pontos por polegada ou, do inglês, "Dots Per Inch" (dpi), suficiente para garantir uma boa qualidade visual. Em média, cada imagem ocupa um espaço de aproximadamente 30Mbytes. Todo o conjunto de 948 imagens totaliza, aproximadamente, 30Gbytes, que estão armazenados em um banco de dados.

O acervo de placas fotográficas está dividido e acondicionado em caixas-box e armazenados no espaço físico da biblioteca do Observatório Nacional.

Acervo de 948 placas fotográficas armazenadas e protegidas no espaço físico da biblioteca do Observatório Nacional. Crédito: Observatório Nacional


Dificuldades para a execução do projeto

As dificuldades são fatores inerentes, de toda ordem, encontrados em qualquer tipo de projeto: problemas externos, inesperados e não previstos, intrínsecos ao grau de complexidade de sua execução. Quanto maior a originalidade do trabalho, maior será a probabilidade de ocorrer problemas não previstos, devido à falta de domínio e conhecimento sobre a matéria estudada.

O processo de planejamento e alinhamento estratégico para a execução de tarefas complexas não é trivial. Existe um compromisso e necessidade de se integrar todas as fases do processo de produção, seja pela dinâmica com que a informação pode ser analisada para uma rápida tomada de decisão, seja pela diminuição do volume de erros.

Em geral, não há como evitar as dificuldades ou problemas ao longo de um projeto. Por mais que haja um minucioso e cuidadoso detalhamento prévio de todos os "se", sempre ocorrerá condições que não foram imaginadas e programadas. Na prática, depois de esgotadas todas as possibilidades para minimizar as dificuldades de acerto, é comum usar o "processo" de tentativa e erro. Mas, dependendo da matéria tratada, utilizar este meio pode ser muito desastroso. Usar a intuição ou métodos empíricos como ferramenta para resolver problemas não é um processo que possa ser comprovado ou justificado.

No caso deste projeto, a principal dificuldade encontrada foi levantar os elementos para compor uma descrição completa e exata do objeto examinado.

Sem dúvida, a falta de informação é um fator fundamental para que um trabalho seja validado na sua completeza. Entretanto, como o projeto não propõe realizar uma investigação científica ou tecnológica do conteúdo das placas fotográficas, pode-se afirmar que é suficiente apresenta-lo "In natura", mesmo que de forma por vezes incompleta, mas com o claro objetivo de retratá-lo como figura da expressão de um levantamento histórico.

Um outro aspecto das dificuldades encontradas foi conseguir apoio, seja por questões financeiras ou técnicas, para suprir, no momento de sua execução, as demandas mais simples deste projeto. Não havia editais abertos nos órgãos de fomento à pesquisa, como o CNPq ou a FAPERJ, para que o projeto fosse submetido e apreciado.

Pode-se citar a falta de equipamentos para digitalização e computacional adequados para gerar imagens com melhor resolução, escassez de material para a higienização, identificação e armazenamento das placas fotográficas. Também, a contratação de mais recurso humano para desonerar e minimizar o tempo de execução do trabalho do pessoal envolvido.


Resultados

Finalmente são apresentados os resultados do levantamento de 948 placas fotográficas em vidro do Observatório Nacional. O projeto foi realizado em 15 meses, desde a fase de planejamento estratégico até a disponibilização das imagens digitalizadas na página Web da instituição. Como planejado inicialmente, o projeto seguiu o cronograma definido no objetivo deste trabalho.

Com o levantamento das placas de vidro realizado e disponível, é perspectiva futura deste projeto realizar uma série de publicações, em revistas especializadas em divulgação da ciência, a partir dos vários assuntos digitalizados.

A consolidação dos resultados da digitalização deste acervo é representada no gráfico estatístico a seguir. Ele apresenta o número de imagens de placas, classificadas por assunto. Clique no gráfico para visualizar as imagens.





Organização e execução do projeto

         Carlos Henrique Veiga (Astrônomo) (cave@on.br)
         Katia Teixeira dos Santos (Bibliotecária) (kts@on.br)
         Maria Luiza Dias (Bibliotecária) (mluiza@on.br)
         Matheus Santos de Oliveira (Bolsista-CIEE) (matheusdeoliveira@on.br)


Colaboradores

         João Luiz Kohl Moreira (Astrônomo) (kohl@on.br)
         Gil Alves Silva (Astrônomo) (gilalvessilva@yahoo.com.br)
         André Wiermann (Físico) (andrew@on.br)
         Jorge Luis de Souza (Geofísico) (jorge@on.br)
         Ney Avelino B. Seixas (Geofísico) (seixas@on.br)
         Rodrigo Cassaro Resende (Designer Gráfico) (rcassaro@on.br)
         João Luis Ribeiro Góes (Desenvolvedor Web) (joaolribg@hotmail.com)
         Vilma Madalena de Assis Souza (Filologia) (vilmas@on.br)


Agradecimentos

Este projeto só foi possível ser realizado graças a todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram com o seu trabalho para a construção e formação deste relevante acervo de placas fotográficas em vidro do Observatório Nacional.


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